O meu título académico mordeu-me?

Outro dia, em conversa com a minha prima, que está num curso de Hotelaria e Turismo (e que boa aluna é - /me so proud), surgiu o seguinte episódio:
 "- Ele perguntou-me "Então mas que saídas tem esse curso?". E eu respondi-lhe que dava para várias áreas de hotelaria e turismo e então ele perguntou-me que área é que eu ia escolher. Eu respondi que estava gostava mais da área de manutenção de quartos, acho piada, sempre gostei de arrumar coisas e deixar tudo direitinho...e o ambiente é agradável, ganha-se bem e... em princípio é o que vou tentar seguir. Havias de o ver " O quê?! Andas a tirar um curso para arrumar quartos de hotel, isso tem algum jeito?"."
Há pessoas que devem "achar-se" (achar-se é o termo). Há por aí muita gente que deve pensar que devíamos nascer todos para ser médicos, doutores, engenheiros, arquitectos e advogados, ou gerentes de empresas e que, tudo o resto são empregos da treta. 
Ora, a essas pessoas eu só tenho uma coisinha a dizer: "tacanhez dá-me pena e comichão, porque além de ser escusada, é incomoda".

Já lá vai o tempo em que se poderia supor que ter um curso superior, ou um cargo superior numa empresa derivava da sabedoria ou da inteligência superior à média.
Enganem-se meus caros; conheço pessoas que após um percurso académico digno de aplausos, conseguem ser tão ocas e tão sem falta de mérito pessoal (e algumas tão burras), que me revolve o espírito pensar na falta de coerência e até de justiça neste mundo.
Num país onde a cunha, a aparência, a instituição de ensino e os números falam mais alto que do que a vontade de aprender/trabalhar, do empreendorismo, da visão e da própria pessoa, nada mais ridículo do que ainda haver pensamentos retrógrados de quem acha que a paixão por uma profissão não tem, só por si, mérito. Há um ditado popular que é "Ama o que fazes e não trabalharás um único dia da tua vida" - é um bocado bíblico e cliché mas faz todo o sentido.
Sim, porque pensem lá, se toda a gente fosse armada ao pinchavelho, os donos de restaurantes e staff seriam formados em engenharia alimentar, relações públicas, gestão e logística, hotelaria, com workshops de contabilidade e higiene e segurança alimentar? O canalizador seria formado em engenharia mecânica,  teria noções de engenharia ambiental? Seria mais proveitoso? Teria mais significado e o seu trabalho seria mais bem elaborado devido à sua formação superior? Creio que não...
Uma coisa é a formação e a aprendizagem que fazemos e a experiência que desenvolvemos a partir daí, outra é a distinção de mérito que nos atribuem por o que fazemos e nem todos (salvo alminhas iluminadas) conseguimos o 'dream job' por que almejamos, no entanto, não será o meu percurso académico ou as notas que tirei que vão dizer 'contrate-me, sou muito melhor do que aquela  pessoa que nem o secundário acabou' ... quem disse? (Diz toda a gente, porque é assim que funciona...! Ora bolas...) 
Não digo que um determinado trabalho não obedeça a requisitos mínimos, tal como eu não posso operar ninguém, nenhum médico será recrutado para elaborar planeamento estratégico de marketing para uma empresa, no entanto não acho que um currículo, um título académico, a profissão que escolhemos nos deva limitar e muito menos deveríamos ser hierarquizados ou julgados pela sociedade desta forma - e nunca num clima económico e de (des)empregabilidade como o actual, muito menos! - segundo fontes próximas, há muitos psicólogos a trabalhar em telemarketing, da próxima vez que ligarem para resolver o problema da internet até podem pedir aconselhamento.. estou a brincar, apesar de não ter piada nenhuma :)

Acredito, ingenuamente, que o saber verdadeiro de uma pessoa é aquele que ultrapassa os livros e o seu percurso académico, é o dom que temos para alguma coisa em especial e o que somos e isso não tem espaço, nem medida, nem cabe em nenhum curriculum...

ps. E prima, força aí nisso, se é o que queres, tens todo o meu apoio! Ah, e se me conseguires ensinar a transformar o caos do meu quarto em algo de jeito, era fixe.. é que o técnico da Cabovisão ontem teve que lá entrar -não era suposto!- e, quando deixou cair  uma caneta, ia levanto uma pantufa minha com ele...e viu os meus soutiens, meias, pijamas e...não há palavras para exprimir a minha vergonha!

11 comentários:

Rain disse...

Uma vez li um artigo sobre a inteligência que nós habitualmente conhecemos e a inteligência emocional. E a verdade é que são praticamente opostos, o que têm muito de um lado são uma lástima no outro. Penso que é por isso que as pessoas mais "inteligentes" nos parecem (e muitas vezes são) mal educadas entre outras coisas. É curiosa esta proporção inversa!

Mas quem é que já não foi maltratado pela secretária do médico que tem um curso apenas em cara de enfado e respostas monossilábicas, e depois o médico até se revelou super simpático?

Muito boa sorte para a tua prima! :)

Storyteller disse...

Eu sou daquelas que tirou um curso muito giro, mas que acabei em ganhar a vida a fazer outra coisa completamente diferente (e adoro de paixão o que faço).
O que é importante é encontrarmos algo que gostemos mesmo e que faça o nosso mundo mexer (mundo = mundo de cada um).

Rosa Cueca disse...

Momento light: aqui em Coimbra toda a gente lê Sócrates: nem doutor, nem engenheiro, apenas paneleiro. O senhor tem o seu mérito, como podes ver.

De resto, já não há paciência para a malta e o seu cursinho. Oh meus amigos, o Gervásio se quiser também tira um curso.
Eu tirei o meu e faço pela vida, que é como quem diz, tou bem lixada porque nem cunhas tenho, vou trabalhar que me lixo todos os dias da minha vida e hei-de ser sempre meio pobretanas. Mas tenho o meu neurónio, tenho saúdinha e tenho boa vontade.
Revolve-me o Teco Teco pensar nos Salvadores Garcia de Resende, cujo ponto alto do trabalho académico foi a moca que apanharam com os amigos Rodrigo de Sá Coelho e a Maria Constança de Albuquerque nas suas águas furtadas de um T5 com vista para o rio.

Anónimo disse...

Bom, Ana sobre cursos/saidas profissionais e QI nada tenho a dizer que já não saibas...
Mas sobre como arrumar quartos está à vontade... ( e acredita que não tirei nenhum curso nessa área!). Preciso de assinar?

Ana, Dona do Café disse...

Epá... eu posso ser muita coisa, vidente é que não consigo - agora fiquei curiosa! É que eu juro que não sei quem me lê!

E arrumar quartos exige arte e disposição e jeito para arrumar quartos, não digo que seja preciso um curso mas para a área de hotelaria tem que haver um rigor que desconhecemos (e não inclui somente a arrumação) mas se te quiseres candidatar a tentar arrumar o meu, olé!

João Mata disse...

Querem saber uma coisa? Benditos os dias em que agarrei no carrinho para viajar de Beja para a Covilhã, ou de Bragança para a Covilhã, ou ainda de Beja para Bragança e depois para a Covilhã e cheguei lá e... "Não me apetece!"
Benditos os cinco anos de propinas (à propina máxima) que paguei (e paguei eu, não foram os meus pais!) para não fazer lá nada sem ser ir para a noite curtir! E sabem porquê? Porque assim vi-me obrigado a fazer-me à vida e hoje sou um animal com o 12º ano mas que pertence ao quadro da instituição onde trabalha. E se tivesse estudado? Seria um licenciado em Marketing a atender num call center, tal e qual a minha mulher, licenciada em Engenharia Alimentar e a aturar os clientes da MEO que descarregam nela em vez de apresentar uma queixa contra a empresa! Ou o meu irmão, licenciado em Antropologia e a correr o Distrito de Bragança inteiro no seu carro à procura de clientes para a empresa que lhe deu trabalho...
A minha mãe pergunta-me: "Agora que moras mesmo em Beja e já não andas para cima e para baixo, porque é que não te metes a estudar outra vez?" Eu respondo com algumas questões: "Aos 30? Para quê? Para nunca chegar a trabalhar naquilo para que estudei?"
E o futuro é assim mesmo! Só vai trabalhar naquilo que quer quem estiver bem calçado! Os outros, por muito que estudem hão-de-se safar noutra coisa qualquer! Se se safarem!

Cheers.

Madame Frufru disse...

Adorei o post Ana. É tudo o que tenho a dizer.

Boa sorte para a tua prima e muito sucesso. Eu tirei um curso e confesso que sou feliz a fazer o que faço actualmente. No final do dia, conta saber que deste o teu melhor e contribuiste de facto com algo.

(Afinal tinha algo a acrescentar) hehehe

Joana | My Pretty Mess disse...

Seguidora nº100! :)

Ana, Dona do Café disse...

Que bonito! Clap clap clap!
E é mesmo assim... C'est La Vie!! :)

Continuo a não acreditar como 100 pessoas nalgum momento das suas vidas acharam que o que digo merece ser seguido ... :D

Beijinhos a todos os 100, na testa, com um café com bombom a acompanhar!

Teresa Valido disse...

Olha pigs, eu cá sou de poucas visitas pois prefiro o "cabeça-a-cabeça", como dizem os nosso amigos de Pari.

Gostei muito do post e acho que devemos sodomizar à bruta a personagem que teve esse discurso com a tua prima. Porque estudei aquilo que sempre quis ser, porque me esforcei(pouco mas já cansava o suficiente), porque tive a sorte de arranjar um emprego na área e...odeio.

Estranhamente o que mais me dá cabo da cabeça são os colegas que fazem questão de deixar bem claro que são Drs. e que não admitem que os utentes (com pouca saúde mental, como sabes) os trate pelo nome.

Quando me dizem que deve ser duro trabalhar com deficientes digo que sim, que realmente há lá muito atrasado mental a TRABALHAR! Xau, desabufo de princesa.
Tete

Nanny disse...

Algumas vezes consegue-se trabalhar na área de formação, com persistência, paciência e uma dose de sorte... já trabalhei na minha área de formação de base... o problema foi que a certa altura estava COMPLETAMENTE farta... tinha um trabalho extenuante e decidi que precisava de parar... ao fim de quase 10 anos, agarrei a bengala de uma pós-graduação, que estava encostada ao canto, e "parti para outra"!
A formação nunca é demais, seja para arrumar quartos de hotel ou para os gerir... e a hotelaria e restauração são mesmo das áreas em que ela faz mais faltinha... credo!