Morcegos na noite

Na calçada molhada pela chuva surgem os primeiros vultos da noite. Roupas discretas, roupas caras, esbanjando luxúria e ociosidade. Sorrisos, gente bonita, luzes intensas confundem-se na penumbra com os néons de curvas intensas que rasgam a escuridão.
A música ecoa forte, compassada no coração da noite e o cheiro intenso a vodka e charros dos grupos encostados às paredes estende-se como um nevoeiro invisível fazendo arder os olhos.
Assim nasce a noite, fatal, discreta, perversa, gulosa e envolvente... Uma eterna amante que seduz as suas presas enfeitiçadas com os seus limites ousados e as suas vestes negras e poderosas.
Corpos jovens dançam entrelaçados ao som de um feitiço, entregando-se às garras voluptuosas que os encanta.
A teia prende os que deambulam na eternidade escura e desafia a beleza e a loucura, tomando-os na sofreguidão do tempo que vai correndo acompanhando do sonoro que impõe a batida, como se fosse o relógio do mundo.
Pela noite dentro, carícias e beijos embalam os corpos quentes e suados enquanto as luzes desenham as suas silhuetas assombrosas a rasgar o fundo negro dormente.
Lá fora a chuva adormece quente no duro alcatrão e a noite parece sorrir sensualmente, como uma melodia de embalar que enlouquece.
A música eleva-se ao silêncio das palavras num olhar animal e no chão garrafas de água e um cheiro pegajoso a tabaco e droga enevoa a sala. Um rapaz lança um olhar pesado e misterioso para a pista onde seres promíscuos libertam-se de todos os seus medos e frustrações ondulando os seus frágeis corpos até exaustão.
O ambiente de voluptuosidade acaricia os vultos da noite e convida-os para o extâse.
Prostitutas de botas de cano fino e vestidos justos dançam como serpentes ao som de uma música de encantamento que só elas ouvem. Homens de aspecto duvidoso afundam-se em bebidas estranhas ao balcão, enquanto um grupo fuma um canhão ao seu lado. Deusas movimentam os seus corpos nas altas colunas, deleitando a multidão excitada. Pares aos beijos, flirtando, tocando-se desinibidamente esquecendo o sexo, as origens...deixando-se conduzir pelo desejo carnal. Jovens de aspecto esgazeado e perdido vagueiam por entre a multidão procurando o seu dealer para, momentos depois, aparecerem na pista no seu outro lado, frenético e irreconhecível querendo mais e mais da noite. E a noite dá...
O ar fica turvo, a música perde-se no tempo, o ritmo aumenta, as luzes ofuscam, a multidão grita, geme, entrega-se totalmente ao álcool e às drogas, aos amantes de uma noite de quem nem o nome se sabe, entrega-se à lua, às estrelas,a este céu escuro...
A noite diverte-se e ri-se cada vez mais alto dos seres flamejantes, dos amantes da noite...dos morcegos desta Noite.

7 comentários:

Van Der Ley disse...

repito-me... gostei... gostei da cadência do texto... o ritmo ébrio imposto pelas palavras... gostei...

NR disse...

Grande texto. :-)
Bjos

Rosa Cueca disse...

Ontem à tarde disse-te: Tenho a impressão que hoje vai sair um post bonito...hoje à noite.

Não me enganei :).
É um dos textos teus que mais gostei de ler. Muito bom mesmo (e sabes que não dou elogios ao desbarato :))

Luís Filipe C.T.Coutinho disse...

A noite é rica nas imagens, nos sons, nos sentimentos e nos cheiros, e fica entranhada no corpo e no espírito até que surja a noite seguinte...


beijos, boa história

Unknown disse...

charros e vodka, um bom coktail,

Sr. Humberto disse...

n vou comentar.
oooops... já comentei.

Drifter disse...

Pura poesia!